Elize Matsunaga - O caso Yoki

A história a seguir contém descrições de crimes extremamente violentos: estupro, assassinato, esquartejamento e trata sobre questões de abuso psicológico. Não é indicado para pessoas sensíveis e é recomendado para maiores de 18 anos.

"A morte é uma curiosidade para todos. Então aquilo que, inicialmente, promove uma repugnância, a partir de uma certa hora, vira um atrativo."


Elize Araújo Kitano Matsunaga, nasceu no dia 29 de novembro de 1981, em Chopinzinho, no Paraná. Filha de Dilta de Ramos Araújo e Valter Zacarias Giacomini. Elize não teve uma infância fácil, sua mãe a criou sozinha e as condições financeiras da família eram precárias. Dona Dilta sempre trabalhou para sustentar a casa e atuou como empregada doméstica por longos anos. Elize estudou em escolas públicas e sempre foi considerada uma boa aluna.


Porém, aos 15 anos de idade Elize foi estuprada por seu padrasto e acabou fugindo de casa. Ela relata no documentário "Elize Matsunaga: era uma vez um crime", que estava tomando banho e percebeu alguém a observando, ela então desligou o chuveiro e foi para seu quarto, momento em que seu padrasto a estuprou. Ela disse que se sentiu humilhada e suja, que sua vontade era se lavar até que a sua pele sangrasse.


Então, ela pegou algumas coisas pessoais, colocou em uma mochila e fugiu de casa. Passou na casa de sua tia que lhe emprestou 50 reais e começou a andar sem rumo pela rodovia. Ela conta que um carro a seguiu, então ela correu em direção a mata, onde dormiu por algumas horas após a fuga.


Quando acordou um homem a encontrou e lhe ofereceu comida e um lugar seguro para dormir, então ela o acompanhou até uma cabana na mata que Elize descreveu como uma casa muito bonita. Elize então jantou, dormiu e na manhã seguinte o homem acionou o Conselho Tutelar.


Elize não disse seu nome e nem o que fazia na rodovia sozinha. Então o Conselho Tutelar a leva para um tipo de abrigo onde ela permaneceu por cerca de 45 dias, até retornar a sua casa.


A família de Elize estava bastante preocupada e procurando por ela durante os dias em que esteve desaparecida, mas, quando Elize retornou para casa, pediu para sua tia, irmã de sua mãe, que a deixe morar com ela, pois não gostaria de ficar na casa de dona Dilta.


Elize não contou sobre o estupro naquele momento, pois segundo ela, ficou com medo de que ninguém acreditasse nela, (algo bem comum entre as vítimas de estupro, já que a sociedade sempre coloca a prova a palavra da vítima, ou tenta encontrar uma justificativa para o crime).


No fim, sua tia permite e conversa com a mãe de Elize, que não vê problema e deixa a filha morar com a tia. Elize ficou com sua tia até os 18 anos de idade, quando se mudou para Curitiba para cursar técnico de enfermagem.


Depois de um tempo em Curitiba/PR, Elize conseguiu emprego em um hospital, como auxiliar de enfermagem de centro cirúrgico, mas muda-se para a cidade de São Paulo, capital. Lá ela começa a trabalhar como acompanhante num site de encontros chamado: Escorts Vogue.


Foi nesse site que Elize conheceu Marcos Kitano Matsunaga. Marcos costumava contratar serviços de acompanhante frequentemente. Foi dito que ele inclusive participava de um fórum aonde descrevia os encontros e dava nota às garotas que contratava.


Marcos era casado na época em que conheceu Elize, e eles mantiveram os encontros extraconjugais por 3 anos antes de Marcos pedir Elize em casamento. Ele pagava uma pensão para Elize, propondo exclusividade, a presenteava com joias, carro, entre outros mimos caríssimos.


Mas antes de falarmos mais profundamente sobre o relacionamento de Marcos e Elize, precisamos saber quem foi Marcos Kitano. Ele nasceu na cidade de São Paulo, provavelmente em 1970, pois morreu com 42 anos em 2012, e passou sua infância no bairro do Parque Continental.


Sua família era rica e estruturada, o que proporcionou a Marcos a possibilidade de estudar nos melhores colégios da região. Em 1999, ele ingressou na faculdade de Administração na FGV, para que pudesse auxiliar a família em seus negócios milionários, já que eram herdeiros da empresa alimentícia Yoki, fundada pelo avô de Marcos na década de 1960.


Assim que Marcos concluiu sua faculdade ele passou a ser um dos empresários responsáveis por tudo na Yoki, uma das empresas mais bem-sucedidas do país, que atualmente é uma multinacional bilionária.


Marcos se casou e teve uma filha com sua primeira esposa, e engatou o seu romance com Elize em 2004, quando sua primeira filha ainda era um bebê. Eles viveram nesse relacionamento extraconjugal por 3 anos e se casaram em outubro de 2009, após Marcos se divorciar de sua primeira esposa.



O casamento entre Marcos e Elize contou com a presença de 300 pessoas e foi uma cerimônia tradicional da Igreja Anglicana. De acordo com relatos da época das investigações do crime, Marcos e Elize viveram em plena harmonia até meados de 2010.





Elize e Marcos formavam um casal peculiar e com gostos excêntricos, pois amavam caçar, inclusive, possuíam o Certificado de Registro do Exército Brasileiro na modalidade CAC (Colecionadores, Atiradores e Caçadores) que dava o direito à posse das armas para fins de caça.



Assim, era comum que eles fossem para o Mato Grosso caçar. Elize mantinha a cabeça de um veado, caçado por ela, empalhado como "troféu" em uma das salas do apartamento do casal. No documentário, Elize relata que após a caça de veados e outros animais, eles faziam a desossa, limpeza e preparação do animal para consumo. Que para ela tudo isso era normal e ela gostava muito de caçar.


Marcos e Elize também costumavam frequentar estandes de tiros para treinar e no interior do apartamento do casal haviam cerca de 33 armas, sendo 4 registradas em nome de Elize.


Além disso, outra característica excêntrica do casal era seu animal de estimação, a "Gigi", uma cobra. Marcos compartilhou com a esposa o desejo de ter uma cobra de estimação e Elize logo concordou, o casal possuía diversos vídeos caseiros da Gigi e alguns perturbadores da cobra se alimentando de um ratinho vivo que antes de ser morto e comido por Gigi acaba urinando de medo. (o vídeo é mostrado no documentário).



Outro amor do casal eram os vinhos. Marcos ensinou tudo sobre "apreciar vinhos" à Elize, eles possuíam duas adegas climatizadas no apartamento que totalizavam mais de 2 milhões de reais em vinhos raros e sofisticados.


E bom, como nem tudo não flores, apesar de o casal dar match em vários gostos e atividades peculiares, após esse período, o relacionamento teria começado a ser conturbado e de certa forma até bem abusivo, uma vez que brigas entre eles passaram a ser constantes. Além disso, Elize e Marcos começaram a sentir desconfiança um no outro sobre supostas traições. Elize ainda relatou que Marcos sentia muito ciúmes dela.


No Documentário já citado, um amigo que cursava Direito com Elize, relatou que Marcos ligava de meia em meia hora e fazia questão de saber com quem Elize estava. O ciúme seria tão intenso que segundo esse amigo, Elize pedia para que amigos homens não falassem enquanto ela estivesse em ligação com o Marcos, para que ele não ouvisse a voz de outros homens perto dela.


Toda a relação ficou ainda mais conturbada quando Elize passou a desconfiar que Marcos a estivesse traindo. Segundo ex-funcionários do casal, Elize teria pedido a Marcos para demitir uma secretária da empresa por suspeitar que eles estivessem tendo um caso. No documentário a Elize não comenta nada a respeito dessas informações, mas foram citações encontradas em outras fontes de pesquisa do caso (links na descrição).


Tempos depois, Elize teria lido mensagens trocadas entre Marcos e uma outra mulher. O que fizeram as suspeitas da traição se tornarem mais fortes.


Nesse meio tempo, ao final de 2010, Elize engravidou, e depois do nascimento da filha do casal, as brigas supostamente diminuíram. Porém, após a filha do casal completar um ano de idade, Elize voltou a desconfiar de Marcos.


As desconfianças e o relacionamento abusivo fizeram com que Elize procurasse uma advogada no início de maio de 2012 para discutir um possível divórcio. E na semana do dia 13 de maio do mesmo ano, Elize contrata um detetive particular para descobrir se Marcos de fato mantinha uma relação extraconjugal.


No dia 17 de maio Elize viaja até a sua cidade natal para visitar sua família e se afastar do ambiente caótico em que estava vivendo, e, no dia seguinte recebe a confirmação de seu detetive particular de que Marcos a estava traindo.


De acordo com o apurado e fotografado pelo detetive, Marcos estava com uma mulher alta e morena no mesmo dia em que Elize viajou, eles teriam se encontrado no hotel Mercure na Vila Olímpia, em São Paulo, jantado no restaurante Alucci Alucci, e em seguida retornado ao hotel.




Em depoimento ao documentário, Elize relata ter se sentido muito mal ao saber essa informação, não só pela traição, mas também, porque o restaurante em questão era o seu restaurante japonês preferido, e que segundo a própria, ela o teria apresentado à Marcos. O sentimento de traição era ainda maior por considerar o restaurante um local especial para ela.


Após as informações obtidas através do detetive, Elize confirmou com algumas amigas que ainda eram acompanhantes de luxo, se Marcos costumava contratar garotas de programa, e elas afirmaram que sim. Elize ainda descobre que a nova amante de Marcos divulgava os seus serviços no mesmo site em que ela costumava anunciar o seu trabalho na época em que conheceu Marcos.


Inconformada com toda a situação, Elize retorna à São Paulo no dia 19 de maio de 2012. Marcos busca Elize no aeroporto e eles vão para casa.



O crime: A ordem cronológica dos fatos.

A sequência de fatos a seguir foi registrada por câmeras de segurança do prédio onde o casal vivia e são referentes aos dias 19 e 20 de maio de 2012.


No dia 19 de maio de 2012

Às 18h30: Marcos, Elize, a filha do casal e uma babá sobem de elevador até a cobertura onde o casal vivia, após chegarem do aeroporto.


Entre 18h30 e 19h30: A babá deixa o apartamento, e somente Elize, Marcos e a filha de um aninho permanecem. Segundo o depoimento de Elize dado a Polícia, foi nesse momento que ela revelou ter descoberto a traição, iniciando uma discussão entre o casal.


Às 19h30: Marcos é visto no elevador, descendo até o térreo para buscar uma pizza. Essas foram as últimas imagens de Marcos ainda com vida.




Após às 19h30: Segundo Elize, depois de Marcos voltar com a pizza foi um caos completo, Elize relatou no documentário, que Marcos sempre a humilhava e jogava na cara o seu passado, a chamando de prostituta. E naquele momento, Marcos teria dito que: "vou te mandar de volta para o lixo de onde você veio". Afirmou também que se ele pedisse o divórcio, a filha do casal ficaria com ele, pois nenhum juiz daria a guarda a uma "puta".


Entre 19h30 e 23h30: Elize relata que eles discutiram, e que ela pegou a arma enquanto Marcos saiu para buscar a pizza e ao retornar ela estava indo guardar a arma, pois se deu conta de que tudo aquilo era uma loucura. Mas de acordo com ela, quando desistiu já era tarde demais, pois Marcos a viu com a arma e disse que ela não tinha coragem de atirar nele.


Elize então profere um tiro contra Marcos, que, de acordo com a perícia realizada posteriormente, o tiro teria atingido a cabeça de Marcos de cima para baixo.


Após o disparo fatal, Elize se viu desesperada e disse que precisava se livrar do corpo de Marcos, que tudo em que pensava era que ela precisava tirar ele do apartamento. Ela então inicia o esquartejamento do corpo em seis partes: cabeça, braços, tórax e pernas. Foi dito que Elize teria esperado por cerca de 12 horas para iniciar o esquartejamento, mas de acordo com os horários das gravações das câmeras de segurança, isso não seria possível.


Outro relato bizarro sobre o esquartejamento foi o de que Elize teria esquartejado a cabeça de Marcos por último. Sendo algo incomum em casos de esquartejamento, já que, normalmente os assassinos retiram a cabeça da vítima primeiro na tentativa de dissociar o esquartejamento e a humanidade da vítima, pois, se aquele corpo não tem cabeça, ele deixa de ser uma pessoa e passa a ser um pedaço de carne.


Além disso, foi constatado que o esquartejamento teria sido "limpo" uma vez que os restos mortais de Marcos não estavam ensanguentados, mas com pequenas quantidades de sangue. Elize também teria interrompido o esquartejamento em dois momentos, se limpado, amamentado a filha e retornado ao trabalho macabro.


Após tudo isso, Elize colocou as partes do corpo de Marcos em sacos plásticos azuis com fitas vermelhas e distribuído os sacos em três malas pretas de viagem.


No dia 20 de maio de 2012

Às 11h30: Elize deixa o apartamento e é vista no elevador carregando as três malas onde estava o corpo de Marcos.



Elize pega uma rodovia sentido Estado do Paraná, porém, quando chega na cidade de Capão Bonito à 230 km da capital paulista, decide retornar. No documentário Elize diz que retornou, porque se fosse até o Paraná, ela certamente contaria para alguém de sua família sobre o crime, e segundo a própria, ela não queria envolver ninguém.


Durante o retorno de Elize para São Paulo, um radar inteligente detectou pela placa do veículo, que seu carro estava com o licenciamento vencido. Ela foi parada pela polícia rodoviária, multada e liberada.


Quando Elize chegou nas redondezas da cidade de Cotia, próximo à cidade de São Paulo, ela relata que rodou por vários lugares que não sabe explicar como chegou em cada local, mas que entrou em estradas de terra e foi desovando as partes do corpo de Marcos.


As primeiras notícias sobre a descoberta de um corpo esquartejado distribuídos em sacos plásticos ocorreram no dia 23 de maio de 2012. E no dia 4 de junho de 2012, 15 dias após o crime, deu-se a identificação do corpo como sendo de Marcos, a partir daí o caso começou a ter ainda mais destaque na imprensa brasileira, pois, um empresário milionário havia sido assassinado de forma brutal.



Após a identificação do corpo de Marcos, Elize se tornou uma pessoa de interesse na investigação, já que, desde o desaparecimento do marido ela tratou o caso como sendo uma viagem de Marcos com a amante. Forjou conversas de e-mails, passando-se por Marcos e mostrou à família Matsunaga em uma reunião marcada por ela, as fotos e informações que seu detetive particular havia fornecido a ela sobre a traição.


Após as análises das imagens das câmeras de segurança do prédio em que Marcos e Elize moravam, onde constatou-se que Marcos subiu com uma pizza na noite do dia 19 de maio e após isso nunca mais apareceu em imagem nenhuma, Elize foi levada sob custódia e presa temporariamente.


A informação foi divulgada por Jorge Carrasco, diretor do DHPP (Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa), que informou que a prisão foi motivada pelo fato de Marcos entrar no apartamento, porém, não sair mais, e Elize no dia seguinte deixar o prédio com três malas.


No dia 5 de junho de 2012: O advogado da família Matsunaga, Dr. Luiz Flávio Borges, afirma acreditar que o crime foi praticado por mais de uma pessoa, dizendo que: "é pouco provável que uma única pessoa tenha realizado toda a preparação, execução, o homicídio, o esquartejamento e a manutenção dos pedaços".


O delegado responsável pelo caso, Mauro Dias, afirmou que a polícia focaria na hipótese de crime passional, pois, segundo ele, existiam evidências de uma traição por parte do empresário.


No apartamento do casal, a polícia encontrou sacos plásticos iguais aos que continham os restos mortais de Marcos. Também foi encontrada uma grande quantidade de armas, sendo uma do mesmo calibre que matou Marcos.

Nesse mesmo dia, Elize foi transferida da 97ª DP até a penitenciária de Itapevi, na grande São Paulo.


No dia 6 de junho de 2012: Elize prestou depoimento ao DHPP e confessou o crime.



Elize contou à polícia que o assassinato ocorreu após uma briga do casal iniciada por uma traição de Marcos e por ela se sentir completamente esgotada das ameaças e humilhações do marido. Ela disse que agiu por impulso e que atirou na cabeça de Marcos. Depois deixou o corpo num quarto da casa por algumas horas e iniciou o esquartejamento com o corpo em situação cadavérica e com o sangue coagulado para que não houvesse muita sujeira.


Ela disse que o levou para o banheiro da empregada, cortou os membros inferiores, superiores e o decapitou com uma faca de 30 cm que estava na cozinha.


A polícia encontrou as provas da traição de Marcos: fotos e vídeos que o detetive contratado por Elize tinha feito. E ao final da noite do dia 06, a reconstituição do crime para comprovar a versão de Elize foi realizada.


No dia 7 de junho de 2012: Peritos concluíram a reconstituição do crime e confirmam a versão de Elize sobre como matou e esquartejou Marcos. A reconstituição foi acompanhada por Elize que cooperou com a operação e inclusive demonstrou como tudo aconteceu.


A Secretaria de Segurança Pública solicitou então a prorrogação da prisão temporária de Elize. E o delegado responsável pelo caso afirmou que as investigações estavam praticamente encerradas.


No dia 8 de junho de 2012: A filha do casal ficou sob a guarda da tia de Elize. E a família de Marcos disse que não pretendia entrar na justiça para disputar a guarda da filha do casal, que à época tinha apenas um ano de idade. Eles ainda solicitaram um exame de DNA afirmando que acreditavam que Marcos não era o pai da criança.


O exame foi feito e a paternidade de Marcos foi confirmada, momento em que a filha de Marcos e Elize foi enviada para os avós paternos.


Resumidamente, o julgamento de Elize foi um dos mais longos da Justiça de São Paulo até então, com duração de oito dias de plenário. O júri condenou Elize Matsunaga, em 5 de dezembro de 2016, a 19 anos, 11 meses e 1 dia de prisão em regime inicial fechado, devido ao homicídio, à destruição e ocultação de cadáver de seu marido.




Agora entraremos na análise jurídica do caso:

Bom, como disse, o julgamento de Elize durou 8 dias. Foi um grande evento midiático na época, pois esse era um dos crimes mais famosos do país. No dia 5 de dezembro de 2016 a sentença de Elize foi proferida. Os jurados se reuniram em uma sala secreta para que pudessem deliberar sobre cada acusação, materialidade, autoria, agravantes e atenuantes do crime.

Após a deliberação do Conselho de Sentença composto por 4 mulheres e 3 homens, o juiz realizou a dosimetria da pena e a sentença de Elize foi concluída e lida em plenário.


Aos assinantes do Patreon a íntegra de 11 páginas da sentença, está anexa ao post.


Eu também utilizei alguns andamentos processuais, guia de execução e recursos do MP como fonte de pesquisa, mas não estão linkadas e nem anexas ao post do caso, porque contém informações pessoais da Elize, como o RG por exemplo. O inteiro teor do processo dela tanto do júri como a execução criminal são sigilosos, mas consegui usar alguns documentos na pesquisa, porque eu tenho acesso de advogada no E-saj, o que facilita bastante nas pesquisas de casos brasileiros, principalmente os que ocorrem no Estado de São Paulo.


Mas enfim, vou citar o que foi mais relevante da sentença de Elize:

  • O Conselho de Sentença reconheceu a materialidade e autoria do crime;
  • De todas as qualificadoras apresentadas pelo Ministérios Público, foi reconhecida apenas a impossibilidade de defesa e destruição e ocultação de cadáver, sendo afastadas as de motivo torpe, e meio cruel, uma vez que ficou comprovado que Elize esquartejou o corpo de Marcos quando ele já estava morto, não havendo sofrimento da vítima nesse momento;


Sobre a dosimetria da pena:

Pra quem não sabe o que é dosimetria penal, é também o momento em que o juiz define a fixação da pena-base do réu. É um sistema trifásico previsto nos artigos 59 ao 68 do Código Penal. Resumindo nas fases são analisadas as agravantes e atenuantes; causas de aumento ou diminuição de pena e a fixação da pena-base.

Em um processo de conhecimento comum, o juiz é quem determina toda a dosimetria de acordo com tudo o que foi apurado e apresentado na instrução penal, mas em caso de procedimento do júri, o Conselho de Sentença é quem reconhece a autoria e materialidade do crime, e as atenuantes e agravantes do caso.


E o juiz determinará as causas de aumento ou diminuição de pena e vai aplicar o tempo de pena que o réu deverá cumprir, além de também determinar qual será o regime inicial de cumprimento da pena imposta.


No caso de Elize, o juiz aplicou o total da pena em 19 anos, 11 meses e 1 dia de reclusão, além de 38 dias-multa pelo cometimento de homicídio qualificado, destruição e ocultação de cadáver. Determinando o regime fechado como regime inicial de cumprimento de pena.


Após a sentença condenatória no processo penal, o que chamamos de processo de conhecimento é expedida uma guia de recolhimento para a VEC – Vara das Execuções Criminais para que se inicie o processo de execução.


Existem muitas pessoas que recorrem da sentença ou são presas provisoriamente, então também existem as guias provisórias, quando a pessoa não foi realmente condenada pelo crime, mas já está reclusa. A guia provisória é importante, porque caso aquela pessoa seja condenada posteriormente, o advogado ou defensor público pode pedir a detração de pena daquele apenado, que é o abatimento da pena por cumprimento. Estou explicando isso, porque Elize cometeu o crime em maio de 2012 e só foi condenada em dezembro de 2016.


Então, nesse caso é possível que se faça o pedido de detração, pois, se uma pessoa ficou presa provisoriamente por 4 anos e foi condenada posteriormente, todo esse tempo em que ela esteve reclusa, conta como cumprimento da pena. Em muitos casos o advogado pede a detração da pena e com a atualização do cálculo da pena, é possível ver que o cliente já atingiu lapso para a progressão de regime ou livramento condicional.


Mas voltando especificamente ao processo da Elize, ela progrediu para o regime semiaberto em 18 de março de 2021, o MP recorreu da decisão, mas aparentemente ela permaneceu em regime semiaberto.


O primeiro pedido de livramento condicional foi feito em 09 de novembro de 2021, o MP deu um parecer contrário à concessão do pedido. Como eu não consegui ler o inteiro teor do processo, aparentemente um novo pedido foi feito esse ano e concedido no dia 30 de maio de 2022. O MP recorreu da decisão, mas no dia 05 de junho de 2022 o TJSP manteve a sentença de primeiro grau que concedeu o benefício à Elize.



Sobre isso, vi muita gente revoltada na internet, mas gente, ninguém fica preso eternamente não, a pena tem como um de seus objetivos a ressocialização dos apenados.


Existem diversos requisitos para que se consiga a concessão do livramento condicional e também, diversos requisitos para que ele continue existindo. A Elize claramente cumpriu todos os requisitos necessários para estar em livramento condicional, e caso ela descumpra algum requisito do LC, o benefício é revogado, ela regride para o regime fechado e todo o tempo em que ela esteve em livramento condicional é desconsiderado, é como se ela não tivesse cumprido esse período de pena, ela precisa comparecer ao fórum para assinar mensalmente ou trimestralmente, comprovar atividade laboral formal, não pode permanecer fora de casa após às 22h00, entre outras coisas.


O LC não é uma liberação total do cumprimento de pena não, a Elize cumprirá pena até 2028, então o Estado estará acompanhando e monitorando toda a fase de cumprimento da pena em livramento condicional.


Finalizando toda essa questão processual, quero deixar registrado aqui uma opinião profissional minha, que sempre que eu vejo que o LC e RA estão bem próximos e meu cliente está em regime semiaberto, eu converso com ele par aguardar o RA, mesmo que ele tenha lapso do LC antes, porque o livramento condicional é muito chatinho.


O LC não precisa respeitar a progressão de regime como o RA, então pode acontecer de uma pessoa cumprir pena no fechado e sair em livramento condicional, mas tem a questão que eu falei né, que descumpriu requisito, todo o tempo de pena que cumpriu em LC tem que cumprir de novo no regime fechado.

E no RA não, se a pessoa descumpre requisito ou comete um novo crime, o benefício é revogado, mas o tempo de cumprimento do RA é contabilizado.


E enfim, já falei demais né gente, se quiserem um episódio específico só sobre execução criminal me mandem lá no insta que eu gravo explicando tudo.


Pra finalizar o episódio de hoje eu queria falar rapidamente sobre o Documentário da Netflix, que foi minha fonte principal de pesquisa.


Eu achei importante usar ele como fonte principal, porque a Elize nunca havia dado entrevistas antes do documentário, então tudo o que falavam em outros veículos de comunicação, sobre como ela se sentia, ou como tudo foi feito, se tratava de especulação.


Eu também vi muito material na internet falando sobre como o documentário a "vitimizou", mas na verdade o que aconteceu foi a humanização de uma pessoa condenada por homicídio. Eu já falei em vários episódios, mas vou repetir, uma pessoa não é o crime que ela comete, então é claro que precisamos humanizar essas pessoas, é pra isso que existem leis, para que os que cometem crimes sejam punidos de forma proporcional, tendo seus direitos respeitados.


O que vimos no documentário é que Elize e Marcos viviam num relacionamento abusivo em que ambos tinham problemas psicológicos. De um lado estava o milionário que se apaixonou por Elize após contratar os seus serviços de acompanhante, e de outro estava uma mulher do interior que trabalhava não importa como garota de programa, na esperança de conseguir se manter na capital.


O que me deixou muito revoltada foi a grande hipocrisia dos moralistas que julgam uma mulher por ter sido garota de programa, mas que ao mesmo tempo contratam essas mesmas garotas.


Esse passado de Elize foi completamente explorado para deslegitimar quem ela é, o fato de ela ser bacharel em direito, ou auxiliar de enfermagem, mãe, mulher, enfim, todas essas coisas ficaram em segundo plano, ficaram ofuscadas com o fato de ela também ter sido garota de programa.


É claro que uma vida sofrida, humilhações diárias e a hipocrisia do patriarcado não são motivos para assassinar alguém, nunca deveríamos questionar a vítima, seja ela homem ou mulher. Mas é importante que a gente perceba essas questões sociais. Porque SEMPRE que uma mulher se apodera da sua sexualidade, isso é visto de forma pejorativa!

Dica de Documentário

Sinopse: Era Uma Vez Um Crime é dividido em 4 episódios:

1. Estado civil: viúva;

2. Uma vida de princesa;

3. A infeliz ideia de Elize; e

4. Os ecos do crime.

E conta a história de Elize, desde sua infância em Chopinzinho, pequena cidade do Paraná, até o conturbado relacionamento com Marcos.

O documentário mostra em primeira mão o lado de Elize, pois até então ela nunca havia dado entrevistas sobre o caso.

Amigos de Marcos, o advogado da família Matsunaga, Promotor de Justiça, advogado de defesa e familiares de Elize também dão os seus depoimentos e contam detalhes da relação e personalidade de Marcos e Elize.

Nos episódios finais acompanhamos os detalhes que sucederam o crime e posteriormente como ocorreram as tentativas de acobertamento do crime, confissão, prisão, julgamento em 2016 e também saídas temporárias de Elize.

Documentário Original Netflix.

Fontes de pesquisa:

https://www.netflix.com/br/title/81043160?source=35

https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Caso_Marcos_Kitano&oldformat=true#Elize_Matsunaga

https://pt.wikipedia.org/wiki/Cronologia_do_caso_Marcos_Kitano

https://catracalivre.com.br/cidadania/elize-matsunaga-revela-trechos-livro-contado-sua-historia/



Sobre a série:

https://www.adorocinema.com/noticias/series/noticia-159620/



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Por Thainá Bavaresco.

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